quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

Novos Talentos...Ensaio Sobre A Loucura


Como vão vocês? Saudades de todos OS LETREIROS e também dos leitores assíduos do blog. Hoje trago uma coisa diferente, sempre publicamos textos, poemas e matérias nossas aqui. Decidi dar espaço ao trabalho de outros colegas de fora do blog. Publico hoje o texto "Ensaio Sobre A Loucura" de Mari Alves, estudande de Publicidade da PUC Campinas. Esse texto é seu debut como escritora, mas, já nesse seu primeiro momento, mostra muita maturidade e propriedade na maneira em que escreve. Espero que gostem, e como sempre, deem o seu valoroso feedback.

Abraços,



Vincius Fuscaldy



Ensaio Sobre A Loucura (Mari Alves)



Olhar fixo. Pode-se ver claramente as pequenas veias saltadas, os olhos vermelhos e as lágrimas que não cessam nunca. A criatura treme, deitada em posição fetal na cama desfeita há dias, Sim, criatura, afinal quando está naquele estado, não parece gente. Seu corpo se agita, ela se debate na cama, chuta o ar, rasga folhas de papel, faz o que pode para aliviar a tensão, mas nada parece aliviar a dor. Tenta não chorar, realmente tenta, mas a bola que se forma em sua garganta a impede de respirar, seus pulmões perdem a eficácia como numa crise de asma e na tentativa desesperada de buscar o ar abre a boca, nada. Os soluços aumentam, a bola em sua garganta se dilata cada vez mais, pode senti-la também no coração. Que dor, que dor, que mal-estar, que necessidade de fazer tudo aquilo parar, é tão impotente, é tão fraca! Porque não consegue esquecer tudo aquilo? Fecha os olhos e as lembranças não a abandonam. Lembranças da infância, lembranças de agora. “Porque ele me deixou? Por que ele se foi? Porque não volta? Porque mentiu? Eu o amo tanto...”. Aquelas frases não a deixam em paz, ficam se repetindo, e repetindo... Bota as mãos na cabeça, fecha os olhos violentamente. Sentada na cama ela balança o corpo para frente e para trás, respira fundo, quer esquecer. Da janela ela olha para o céu e sorri com as memórias de uma época feliz. “Eu era feliz, eu fui feliz naquele momento, eu fui!” O choro é tão forte, tão intenso, tão sofrido... Olha para baixo, não é tão alto, será que bastaria para fazer tudo acabar? Projeta o corpo para fora da janela, sente o vento secando suas lágrimas que descem pelo rosto. Não, não tem coragem, tentou por várias vezes, mas não consegue. Diante de sua fraqueza, é engolida pelo passado.
Foi sempre sozinha... Uma criança tão linda, tão saudável, porque haveriam de ter a coragem de largá-la? Entendia que seus pais precisavam trabalhar para sustentá-la e a seus irmãos, entendia que vieram de uma família simples e que provavelmente desejavam dar aos filhos todo o conforto que não puderam ter, entendia tudo isso, mas tudo que desejava era carinho. Sua verdadeira mãe era sua avó, aquela doce senhora que cuidava dela todos os dias, como a amava e era amada! Odiava os dias em que aquele rato, aquele demônio saía pelo portão e voltava bêbado, cambaleando e infelizmente se lembra até hoje das maldades que ele fazia para sua querida avó... “Eu te odeio, eu quero você morto! Se eu pudesse mataria você com minhas próprias mãos!” De fato, palavras e sentimentos pesados para uma garotinha de cinco anos.
Nunca suportou a dor de ser abandonada. Foi crescendo independente, confinada entre as paredes do seu quarto, sozinha durante os dias, isolada. Tinha muito tempo para si mesma, tinha muito tempo para desenvolver coisas boas e ruins. Agora era mais dura com seus sentimentos, negava a falta que sentia dos pais que continuavam em sua rotina atribulada, negava a falta que sentia de um colo, de um carinho, de um simples “Eu te amo”. Fazia anos que não dizia ou ouvia aquela frase tão bonita. Durante a adolescência, escondia-se atrás de um coração de pedra. “Não amo ninguém, não me envolvo com ninguém”, era incrível como se sentia bem e protegida com aquele escudo.
Ela volta a si. Seu coração está disparado, cada vez mais seu corpo se balança na cama. “Porque ele tinha que aparecer e destruir minha vida? Estava tudo tão bem, eu não precisava sofrer mais!” Foi o amor. Sim, ela amou, amou muito e continua amando. Aquele rapaz conquistou seu coração, a fez esquecer-se de quem ela havia se tornado, ela abandonou seu escudo, cedeu. Foi o ano mais feliz de sua vida, apesar de toda a distância. Ele era seu porto seguro, estava sempre ali para apoiá-la quando a angústia de não poder estar junto de seu amado a fazia chorar. “Eu te amo”, ele dizia através da tela do computador. Ela sorria, estava feliz, ele nunca a abandonaria! Faziam planos para se encontrarem e viverem juntos. Tinha vontade de ir ao encontro de seu amor, mas seus pais não sabiam de nada. “Você está louca? Não pode sair daqui e ir para outro estado atrás de alguém que você nem sabe quem é!”, eles diriam. Chorava, chorava todos os dias. Os dois consolavam-se como podiam. “Promete que nunca vai me abandonar?” “Prometo meu amor, nunca vou te abandonar!”. Os meses se passaram, chegou o novo ano e ela estava viciada. Jamais poderia viver sem ele, jamais! Fazia planos futuros, casamentos, filhos... Ria muito de si mesma. “Nunca pensei que fosse amar alguém, havia decidido que nunca me casaria ou teria filhos!”.
Mas daí veio a bomba. “Sinto, mas não podemos mais continuar. Meu amor por você é verdadeiro, porém muitas coisas aconteceram em minha vida e devo partir para longe, não voltarei nunca. Quero que saiba que te amo, que sempre amei, e você foi tudo que eu esperei ter durante a minha vida. Te liberto agora, quero que viva sua vida, que seja muito feliz com quem te merece, pois este não sou eu. Adeus.” Ela implorou para que ele ficasse, não teve acordo. Descobriu depois que uma outra moça levava o filho do seu amado no ventre e que este se sentia na obrigação de formar uma família em outro país. Chorou, chorou a noite toda, chorou o dia todo em que não se levantou para nada da cama. Estava em estado de choque. Os meses das férias escolares se arrastaram cheios de depressão, de tristeza. Os amigos diziam para esquecer, não os culpava, tinha certeza que não a entendiam, afinal os detalhes de seu delírio ela escondia dentro de si, sua alma era sua própria caixinha de lembranças. Bebia todas as noites para tentar dormir e quando conseguia, era um sono pesado, cheio de sonhos com seu amado. Ah, como doía! Não tinha vontade de sair de casa, dispensava ligações. Percebia que jamais deveria ter abandonado a segurança que a falsa personalidade adquirida antes daquele acontecimento lhe oferecia, mas não conseguia mais voltar, aprendera do modo mais difícil a verdade do amor.
Sabia que não estava bem, que nunca estivera bem. Sabia que toda aquela depressão, que aquelas vozes e pensamentos estavam ficando cada vez mais fortes. Tinha que ser falsa todos os dias. Mentir para a família, mentir para os amigos, mentir para si mesma. “Eu estou bem” dizia em frente ao espelho dando um sorriso forçado. “Se eles souberem, vão querer me levar até um psicólogo ou psiquiatra, eu não quero! Eu devo vencer isso sozinha, eu devo proteger todos a minha volta dessa decepção!”
Ela estava sempre ali, deitada em sua cama, olhar fixo no nada. Seu corpo tremia, não conseguia respirar. Chorava e seus soluços eram altos e constantes. Gritava. Derrubava os objetos do quarto, se levantava e girava olhando para o teto. Se jogava no chão, abraçava o próprio corpo, o rosto lavado em lágrimas. Debatia-se, balbuciava palavras desconexas para ninguém. Arranhava o peito, queria que aquela dor no coração parasse. Apertava a garganta, precisava de ajuda, bebia.
A dor nunca deixou a bela garota, talvez nunca deixe. Até hoje ela tem seus ataques de loucura, é quase como uma convulsão. Continua repetindo frases soltas.


“As paredes sabem de tudo”


fonte foto: Floquinhos de Algodão Blog

Um comentário:

Anônimo disse...

Olá galerinha! Obrigada por terem postado meu monólogo aqui, fico muito feliz e espero que gostem!
Beijos.

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